Cristãos diante do perigo do neoautoritarismo
No início do mês de novembro de 2014 vários veículos da grande mídia divulgaram uma notícia, no mínimo, estranha. Essa notícia dizia que o atual partido político governista no Brasil tem um projeto de extinguir o Senado brasileiro. Para isso, foi utilizado o argumento que o Senado trata, em essência, de questões federativas e que, tal função, poderia ser exercida pela câmara de deputados ou por uma comissão dessa câmara.
Essa notícia, se for tomada de forma isolada, poderia ser vista como apenas um jogo político ou como um processo saudável de renovação da vida política. No entanto, se ela for colocada dentro do cenário internacional, ganha proporções bem diferentes e até mesmo catastróficas. De um lado, no nível da macro política internacional, temos visto o perigoso renascimento de projetos imperialistas e militaristas. Esse perigo é representado, por exemplo, pela Rússia de Putin, pelo discurso expansionista da China e da Turquia e pelo recém criado e fundamentalista Estado Islâmico. Do outro lado, a América Latina vive uma onda de governos populistas, com forte tendência ao autoritarismo, governos que são liderados por Cuba e pela Venezuela.
Lamentavelmente o início do século XXI não é marcado pelo aprofundamento da democracia e da cidadania, mas pelo retorno do velho modelo de Estado forte, de perseguição às liberdades individuais e de ameaças a liberdade religiosa. Parece que o mundo não aprendeu com os horrores causados por regimes totalitários, como o nazismo e o socialismo. Parece que, mais uma vez, a humanidade vai enfrentar guerras por colônias, a implantação de um regime político único, com partido único, a perseguição aos jornalistas, aos intelectuais e a forte perseguição aos cristãos. Nesse caso, a história, como diria Paul Valéry, se repete. Os horrores da primeira metade do século XX parecem que estão vivos dentro do século XXI, sendo que dessa vez é na versão Neo, ou seja, o neoautoritarismo.
É nesse contexto, de repetição triste da história, de retorno do terror e do neoautoritarismo, que deve ser pensado o projeto do partido governante no Brasil de extinguir o Senado. Isso é apenas uma pequena, mas fiel, engrenagem do neoautoritarismo. Em grande medida, é um governo que está voltado para colocar em prática as orientações que emanam de Cuba e da Venezuela e não exatamente com o desenvolvimento nacional.
Tudo isso é muito preocupante. Os países cristãos da América Latina desfrutam de grande liberdade religiosa e não experimentaram, de forma direta, os horrores dos regimes totalitários implantados na Europa (nazismo, socialismo) na primeira metade do século XX. Tanto Stalin (socialismo) como Hitler (nazismo) viam a América Latina como uma região pacifica que, justamente por esse motivo, aceitariam de bom grado suas ideias autoritárias. Parece que o início do século XXI está vivendo, como um pesadelo, os sonhos de implantação na América Latina de um regime totalitário. Atualmente governos e multidões de cidadãos, em países latino-americanos, são iludidos com políticas assistencialistas, com belas propagandas nas mídias e com a visível deterioração do padrão de vida.
A implantação do neoautoritarismo na América Latina é muito perigoso para a democracia, para a cidadania e especialmente para os cristãos. Historicamente a ideologia socialista é ateia, vê a religião como alienação e como inimiga do regime socialista, sempre perseguiu os cristãos, condenou e matou milhares e milhares de cristãos pelo simples fato de não aceitarem ou discordarem do regime socialista.
Nesse contexto, os cristãos precisam ser voz de profecia, serem “servos bons e fiéis” (Mateus 24, 45) que anunciam, com coragem, que “todo o poder emana de Deus” (João 19, 11) e que, por isso, “todo joelho se dobrará […] e toda língua confessará a Deus” (Romanos 14, 11). Os cristãos precisam deixar claro que não se pode servir ao Estado, a um regime político neoautoritário e ao culto a seus governantes. É preciso lutar pela implantação da justiça social, da distribuição de renda e do aprofundamento da cidadania, mas tudo isso pode ser feito dentro da ordem e da democracia, sem, por exemplo, precisar extinguir o Senado e ações semelhantes. Só um regime autoritário tem propostas de, por exemplo, extinguir o Senado.
É bom lembrar a responsabilidade que os cristãos tiveram na ascensão do nazismo na Alemanha da década de 1930. No período de 1930 a 1932 a Alemanha foi governada por uma coalisão política liderada pelo partido social-democrático. Nesse período o líder do governo foi Heinrich Brüning, um católico, membro do Partido de Centro, de forte presença católica. Por diversos motivos (crise econômica, crise política, etc) essa coalisão política, tendo a frente líderes políticos cristãos, promoveu uma “politica de tolerância” com o partido nazista e com suas ideias autoritárias. O resultado dessa política é que de “tolerância” em “tolerância” o partido nazista chegou ao poder em 1933 e promoveu a maior barbárie que a humanidade já presenciou. Esse triste fato histórico não pode se repetir. Os cristãos não podem simplesmente ser “tolerantes” com o neoautoritarismo. É necessário ir além de uma saudável política de diálogo político, é necessário denunciar o caráter perigoso e até mesmo pecaminoso do neoautoritarismo.