RITOS FÚNEBRES MONÁSTICOS – EXPLICAÇÕES DE DOM PAULO PANZA
Não há nada de especial nos ritos fúnebres monásticos, apenas conservamos os costumes que antes acompanhavam todos os cristãos.
“Antes” não significa nenhuma eternidade, apenas algumas décadas.
Penso que nosso tempo, tão temeroso da morte e tão apegado ao transitório, relegou a morte e o morrer – segundo a filosofia as únicas verdadeiras questões dignas do pensar humano – a algo pragmático, frio e rápido.
Algo para esquecer enquanto nos enchafurdamos nos afazeres, nos teres e nos prazeres dessa vida caduca e passageira.
Todo o ritual é o belo ritual da Igreja Católica para todos os seus filhos que, infelizmente, como tantas outras coisas, muitos dos próprios ministros da Igreja não sabem.
1. O morrer.
Um católico deveria ser sempre acompanhado ao morrer com as orações.
A família – e no caso do monge a comunidade monástica – vela enquanto o moribundo agoniza.
Não um velar mórbido, mas, um velar acompanhado de orações e carinhosa atenção ao que se despede do corpo.
Rezam-se os Salmos das Completas – oração da noite da Igreja – o santo rosário, as ladainhas, etc…Enfim, oração.
No caso de Dom Joaquim Zamith, as horas do Ofício Divino foram todas rezadas na cela em que jazeu em suas últimas horas.
Mesmo a Santa Missa, um dia antes de seu falecimento, foi celebrada ali e ele pôde receber o Viático – a comunhão que, nesta hora, se torna verdadeiramente “alimento para o caminho”.
Entrementes cada monge velou por algumas horas, rezando por e com ele.
Ao recebermos a notícia da morte, o sino maior do mosteiro toca por um longo período, anunciando a “Páscoa” a “passagem” ou “passamento” do irmão que entregou sua alma a Deus.
2. O corpo é preparado com as vestes monásticas.
No caso de Dom Joaquim, além do santo hábito monástico beneditino, foi revestido também dos paramentos sacerdotais, porque era padre, e das insígnias abaciais: a mitra, a cruz e o anel.
O caixão é de cipreste (pinus) que é símbolo da eternidade porque aponta para o céu, porque permanece sempre verde, mesmo nos mais rigorosos invernos, como a esperança cristã e também porque se curva ao sabor dos ventos, mas, não se quebra, como a fé de quem crê no Cristo e na Vida Eterna.
Isso não é um costume monástico, embora os mosteiros prezem muito a discrição e simplicidade, mas, “copiamos” dos funerais do papa.
Nós colocamos também galhos de cipreste como “leito” para este último sono, sempre com o símbolo da eternidade feliz e lembrança das ervas perfumadas que foram colocadas junto ao corpo morto do Senhor.
Seu corpo foi envolto em linho, lembrança do Batismo, quando o cristão é revestido da veste branca, a veste das testemunhas de Cristo; mas, também porque Cristo foi envolto em linho quando morreu, assim, a morte do cristão encontra sentido na morte de Cristo que nada mais é do que nascimento para a vida verdadeira e feliz.
3. O ritual da recepção do féretro na porta da casa (no caso o mosteiro) é da Igreja.
No velório colocamos junto à essa o círio pascal, pois a morte e ressurreição de Jesus ilumina sempre nossa vida e nossa morte.
Este mesmo círio, lembrança da coluna luminosa que seguiu à frente dos hebreus quando passaram o Mar Vermelho e vaguearam rumo à Terra Prometida por quarenta anos, é levado à frente do defunto enquanto seu corpo é transportado para a Missa.
Também os ritos de translado para a Igreja antes da Missa de Corpo Presente não é exclusividade dos monges.
Nós apenas cantamos a ladainha de todos os santos, pedindo que eles “rezem por ele”.
4. Na igreja o defunto retoma o lugar que ocupava enquanto vivo, ou seja, Dom Joaquim, como padre, fica no presbitério, voltado para o povo.
Se fosse um irmão não ordenado, ficaria fora do presbitério com a face voltada para o altar.
Todos os outros ritos são os mesmos de qualquer cristão.
Há um “modo de fazer” próprio dos monges e alguns detalhes que apenas revelam delicadeza ou devoção.
Entre estes destaco a “despedida” de Nossa Senhora antes de sair o féretro, quando o finado é levado à frente da imagem da padroeira da igreja e o coro canta um hino a Nossa Senhora.
A cada noite, durante as Completas (oração da noite), os monges cantam aí, diante de sua senhora e rainha.
É significativo que a comunidade o faça uma última vez pelo irmão falecido, não acha?
Enquanto o corpo é descido à sepultura, entoa-se as antífonas marianas, sendo que, quando a última, “Regina Coeli”, é entoada, ao sino fúnebre se juntam os outros sinos, pois esta é a antífona que cantamos a Nossa Senhora na Páscoa.
5. Além do que relatei acima, durante sete dias uma lamparina e uma cruz marcam o lugar do defunto na igreja (no coro monástico onde cantava o ofício).
Em seu lugar no coro, assim como no capítulo e no refeitório, pelos mesmos sete dias, é colocada uma cruz.
Celebra-se a Missa por 30 dias em sufrágio de sua alma.
Dom Paulo Panza é prior do Mosteiro de São Bento de Vinhedo, SP.