No Congresso norte-americano, Papa Francisco fala de imigração, Cuba e capitalismo
Assumindo um espaço nunca dado a um líder da Igreja Católica, o papa Francisco fez nesta quinta-feira (24) um discurso histórico no Congresso dos Estados Unidos, país que conta com 70 milhões de católicos.
Em um discurso de quase uma hora e fortemente aplaudido, o Pontífice pediu o fim da pena de morte em todo o mundo, condenou qualquer tipo de fundamentalismo, exigiu o acolhimento de imigrantes e condenou o sistema econômico atual baseado em exploração que, segundo ele, leva à fome e à pobreza.
Além disso, Francisco pediu "coragem e audácia" aos países que têm diferenças históricas, em uma clara menção às relações diplomáticas dos Estados Unidos com Cuba e Irã. Elogiando o que chamou de "esforços feitos nos últimos meses na tentativa de superar as históricas diferenças ligadas a dolorosos episódios do passado", Francisco disse que "é seu dever construir pontes e ajudar todo homem e mulher a fazer isso". "Quando nações que estavam em desacordo retomam a via do diálogo, novas oportunidades se abrem a todos. Isto exigiu, e ainda exige, coragem e audácia", afirmou o Papa, discursando em inglês, idioma que treinou durante as férias. No ano passado, o líder católico ajudou a mediar a retomada das relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos, após mais de meio século de ruptura.
Antes de visitar Washington, Francisco esteve por quatro dias na ilha caribenha, onde se reuniu com o presidente Raúl Castro e seu irmão Fidel, líder da Revolução Cubana. Havia uma grande expectativa sobre a possibildiade do Papa fazer um apelo contra o embargo econômico à ilha. No entanto, o tema não foi citado em seu discurso, que se limitou a exaltar a importância do diálogo e a da construção de pontes entre os países.
Capitalismo – Em seu pronunciamento, Francisco citou a figura de quatro norte-americanos considerados heróis do país: o ex-presidente Abraham Lincoln, que completa 150 anos de seu assassinato; o reverendo negro Martin Luther King, que há 50 anos liderou uma marcha em Selma pela igualdade de direitos civis; a fundadora do "Catholic Worker Movement", Dorothy Day; e o ativista Thomas Merton, que neste ano celebra o centenário de seu nascimento.
Um dos temas centrais de seu discurso foi a defesa do meio ambiente e a crítica aos modelos econômicos atuais, baseados em exploração de recursos naturais e os quais, de acordo com Francisco, provocam situações de desigualdade, fome e pobreza.
"A luta contra a pobreza e a fome deve ser combatida constantemente de diversas formas, especialmente nas suas causas", disse. "Parte deste grande esforço está na criação e na distribuição de riquezas. O correto uso de recursos naturais, a apropriada aplicação da tecnologia e a capacidade de orientar o empreendedorismo são elementos essenciais para uma economia que tenta ser moderna, inclusiva e sustentável", argumentou Jorge Mario Bergoglio, que neste ano lançou uma encíclica (documento autoral mais importante de um Papa) sobre meio ambiente e escassez, intitulada "Laudato Sí" (Louvado Seja). Guerras religiosas – O Pontífice também fez uma dura crítica às formas de fundamentalismo e recomendou que as autoridades mundiais evitem combater o terrorismo com métodos de violência.
"Nenhuma religião está imune às formas de engano individual ou ao extremismo ideológico. Isto significa que devemos estar particularmente atentos a qualquer forma de fundamentalismo, tanto religioso quanto de outros gêneros", disse. "Somos todos plenamente conscientes, e estamos profundamente preocupados, com a inquietante situação social e política do mundo atual. O nosso mundo tem se tornado cada vez mais um lugar de violentos conflitos, ódio e brutas atrocidades cometidas em nome de Deus e da religião", criticou.
De acordo com o Papa, "é necessário um delicado equilíbrio para combater a violência perpetrada em nome de uma religião, ideologia ou de um sistema econômico, ao mesmo tempo em que se deve proteger a liberdade religiosa, intelectual e individual".
"Há uma tentação que devemos nos atentar: o simples reducionismo de ver apenas o bem e o mal, ou, se preferirem, os justos e os pecadores. O mundo contemporâneo, com suas feridas abertas que tocam tantos dos nossos irmãos e irmãs, exige que enfrentemos qualquer forma de polarização que poderia nos dividir entre estes dois campos. Sabemos que, na tentativa de nos liberarmos do inimigo externo, podemos cair em tentação de alimentar um inimigo interno", pontuou. Para Francisco, "imitar o ódio e a violência dos tiranos e dos assassinos é a melhor maneira de pegar o posto deles". "A resposta deve ser de esperança, cura, paz e justiça", argumentou.